Uma matéria divulgada recentemente pelo jornal The Jerusalem Post, reafirma que o sistema de defesa antiaéreo S-400 Triumf foi testado pela Turquia, país membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), contra jatos F-16C/D e F-4E-2020 de sua própria força aérea. A informação dos testes não é novidade, sendo conhecida desde novembro do ano passado. Porém, alguns detalhes revelados esta semana pela agência russa TASS trouxeram um novo foco, que para muitos, reforçou a sequência dos atos que culminaram na expulsão do país do programa JSF – Joint Strike Fighter.
Desde o início, as negociações entre russos e turcos foi alvo de protestos dos americanos, que, por várias vezes, preveniram o governo de Ancara que adorariam sanções prevista na Lei de Combate aos Adversários da América por Sanções (CAATSA – Countering America’s Adversaries Through Sanctions Act), que poderia resultar no embargo das entregas dos F-35A. Em 2019 quando o contrato dos S-400 está em seus detalhes finais, o lote inicial de F-35 já estavam prontos para entrega, com pilotos turcos no estágio final de treinamento nos EUA. O embargo acabou se concretizando, as aeronaves não foram entregues e, o ato seguinte, foi a expulsão da Turquia do programa JSF. Ao todo, oito F-35A já estavam prontos e nas cores da Força Aérea da Turquia e outros seis estavam na fase final de montagem.
Vale lembrar que a Turquia era um dos parceiros (nível 3) do programa JSF, originário do caça da Lockheed Martin, e como tal, investiu milhões e criou linhas de suprimentos fabricadas localmente para atender a frota mundial. Sua retirada do programa trouxe não só problemas políticos, mas financeiros e logísticos a cadeia de produção, uma vez que todas as empresas turcas foram alijadas do JSF.
Ante de aplicar a CAATSA, o governo dos EUA fez todos os esforços e, para parte da mídia americana, chegou até a implorar à Turquia para esta não se voltar para Moscou. Antes de aplicar as sanções, um senador americano chegou a sugerir que os EUA comprassem os S-400 russos da Turquia, compensando Ancara de forma econômica. Naturalmente, isto foi considerado um “delírio” do parlamentar, pois Moscou não deixaria sua tecnologia simplesmente ser repassada por meio de uma venda malfadada aos americanos.
O Governo Turco ignorou as ameaças e as primeiras baterias foram entregues no dia 19 de julho de 2019 no Aeroporto Murted, conhecido como Base Aérea Akinci, na capital Ancara. Ao adquiri-los por US$ 2,5 bilhões, a Turquia se distanciou de seu aliado tradicional e se tornou um aliado mais próximo da Rússia, gerando desconforto na OTAN.
As entregas se estenderam até setembro, com a principal unidade lotada em Akinci. A promessa russa era que todo o sistema estaria operacional até abril de 2020, o que de fato não aconteceu e, informações atuais dão conta que não estará até o fim do ano. Isso levantou várias questões, entre elas, qual era o objetivo da Turquia em gastar bilhões em defesa aérea em meio a um crise econômica: E se precisasse, a solução não poderia ser algo no padrão OTAN?
Apesar do uso dos S-400 contra os F-16 já ser conhecido e relatado no ano passado, novos detalhes vindos da mídia russa parecem mostrar que algo mais estava acontecendo nesses testes. A narrativa oficial da Turquia até então era que os ensaios foram apenas para testar as comunicações seguras entre as plataformas e evitar o fogo amigo, e não, derrubar seus próprios jatos. Porém as novas informações corroboram o que os serviços de inteligência da OTAN e dos EUA já sabiam.
Por traz dos testes de comunicação e enlace de dados, o principal objetivo – patrocinado pela Rússia, era saber o desempenho de seu sistema de defesa aérea contra os aviões dos EUA e da OTAN e como na prática funciona os sistemas de autoproteção das aeronaves quando “iluminados pelo Triumf”. A maior lástima deste plano, foi o embargo das entregas dos F-35 à Força Aérea da Turquia, que frustrou os russos de um teste do S-400 x Lightning II.
O S-400 da Rússia é o principal e mais moderno de seus inúmeros sistemas de defesa antiaérea e saber se ele é eficiente, onde pode melhorar e quais as vulnerabilidades contra potenciais inimigos é de suma importância. Vale lembrar que alguns sistemas antiaéreos russos têm sido questionados. Os S-200 usados pelo regime sírio abateram um avião russo IL-20M por engano em 18 de setembro de 2018. A versão iraniana do sistema russo obteve bom desempenho em 2019 com o abate de um drone RQ-4A americano em 20 de junho, mas também, abateu um Boeing 737-800 da Ukraine Airlines em 8 de janeiro deste ano, outra vez por engano.
Na Síria, há questões sobre a confiabilidade dos S-300 e Pantsir S-1 para rastrear drones e caças de 5ª geração. O sistema Pantsir também foi destruído por drones turcos em batalhas em Idlib e na Líbia este ano.
Por outro lado, o que a Turquia conseguiu neste teste é a parte menos visível até agora. Muitas perguntas ficaram no ar. Por que Ancara testaria o funcionamento do S-400 contra seus próprios F-16, a menos que estivesse a mando de Moscou? Os S-400 eram mesmo necessários? Quais os reais prejuízos econômicos, políticos e dentro da OTAN para o país?
Já para os russos, trazer à tona esta nova face dos testes S-400 x F-16 é justificada pela própria mídia do país como como parte de uma tentativa de afundar qualquer possibilidade de uma reaproximação Turquia x EUA, além de semear mais desconfiança a seus aliados da OTAN.