A Real Força Aérea é considerada uma das mais importantes do mundo, e para muitos, um modelo em termos de estrutura que nas últimas décadas vem sofrendo diversas reformulações, algumas significativas e outras até mesmo questionáveis. Como é a RAF do primeiro quarto de século, sua estrutura e frota e, como ela se projeta para os próximos anos é o que veremos a seguir.
Rudnei Dias da Cunha
A mais antiga das forças aéreas, a Royal Air Force (RAF) britânica foi criada no dia 1º de abril de 1918, unindo numa única força os componentes aéreos do Exército Britânico, o Royal Flying Corps, e o da Marinha Real, o Royal Naval Air Service. Essa fusão foi resultado de uma profunda revisão feita no estado de defesa do Reino Unido, em 1917, causada pelos ataques a cidades britânicas, realizadas por bombardeios alemães.
No período entre as duas guerras mundiais, a RAF conseguiu resistir às iniciativas que visavam a sua extinção, propostas tanto pelo Exército como pela Marinha. Isso se deveu em grande parte ao seu chefe de estado-maior, Marechal-do-Ar Hugh Trenchard, que convenceu o gabinete de governo britânico da utilidade da RAF no policiamento do Império Britânico, usando uma quantidade pequena de esquadrões, – o que traria grandes economias – importantes para a recuperação econômica nas décadas de 1920 e 1930.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a RAF desempenhou importante papel para alcançar a vitória aliada, crescendo tanto em número, como em qualidade. O desenvolvimento do radar aerotransportado foi decisivo para bater os submarinos do eixo durante a Batalha do Atlântico; e os bombardeiros de longo alcance, como o Avro Lancaster, Handley-Page Halifax e Short Stirling, foram empregados no ataque noturno às cidades e centros de infraestrutura e produção de armamentos alemães e italianos, resultando, em concerto com a US Army Air Force, no enfraquecimento da indústria de guerra inimiga. O custo foi alto, no entanto, 57.205 aviadores da RAF perderam suas vidas em missões de bombardeio.
Alcançada a vitória, sobreveio um breve período de redução de efetivo de pessoal e meios aéreos, mas a crise causada pelo bloqueio soviético de Berlim, em 1948, logo demonstrou que o antigo aliado era agora o inimigo. Com a necessidade de se preparar para um eventual conflito com a União Soviética, a RAF novamente foi expandida, com esquadrões de caça sediados não só na Grã-Bretanha, mas, também, na Alemanha Ocidental.
O advento da era atômica fez com que o Reino Unido buscasse obter suas próprias armas nucleares, além de bombardeiros capazes de as lançarem sobre o território soviético. Nascia assim, a “V-Force”, formada por três tipos diferentes de bombardeiros a jato, incorporando diferentes refinamentos aeronáuticos: o Vickers Valiant, o Avro Vulcan e o Handley-Page Victor. A “V-Force” foi a força de ataque nuclear britânica, de 1955 até 1968, quando o emprego estratégico de armas nucleares passou para a Marinha Real, com mísseis balísticos Polaris, lançados desde submarinos. Armas nucleares táticas continuaram à disposição da RAF e de aeronaves da Marinha Real embarcadas em porta-aviões, no entanto, até meados da década de 1990.
Até a queda do Muro de Berlim, em 1989, e a subsequente extinção da União Soviética, em 1991, a RAF continuou mantendo sua postura de defesa e de resposta frente a um eventual ataque soviético, com aeronaves como o Tornado e o Jaguar formando a espinha dorsal da sua capacidade de ataque. Tal capacidade foi comprovada durante a Primeira Guerra do Golfo, no início de 1991.
Logo em seguida, no entanto, o chamado “dividendo da paz”, com a eliminação da ameaça soviética, levou a profundas reduções de pessoal, unidades aéreas e aeronaves. No entanto, uma aeronave que tinha sido desenvolvida ainda sob a ótica de um enfrentamento entre os países da OTAN e do Pacto de Varsóvia – o Eurofighter EF2000 – acabou escapando dos cortes, e denominado de Typhoon, é hoje a espinha dorsal da força de combate da RAF. No entanto, a aquisição do Typhoon acabou por fazer com que a RAF tivesse de se desfazer de outros tipos de aeronaves que ainda eram perfeitamente adequadas para emprego e que haviam passado por diferentes ciclos de modernização, como o Harrier GR7/9/9A e o Jaguar GR3/3A.
A partir de 1991, a RAF participou de diferentes operações aéreas, nos Bálcãs, Iraque, Afeganistão, Líbia e Síria, em conflitos assimétricos e que evidenciaram três aspectos importantes: o emprego de armas de precisão, como bombas guiadas a laser e GPS; o uso de Sistemas Aéreos Remotamente Pilotados, em missões de reconhecimento e com capacidade de lançar armamento de precisão; e de aeronaves devotadas à realização de missões de Inteligência, Vigilância, Aquisição de Alvos e Reconhecimento (ISTAR, na sigla em inglês).
Assim, o Typhoon ganhou a capacidade de emprego ar-solo na sua versão atual, FGR4; os drones MQ-9A Reaper foram adquiridos para emprego sobre o Afeganistão; e aeronaves ISTAR foram desenvolvidas, tendo por base aeronaves como o Beechcraft King Air 350 e o Bombardier Global Express. Para o atendimento de outras capacidades já reconhecidas, como o emprego de aviões-tanque para reabastecimento em voo e de aeronaves de transporte estratégico, a RAF passou a ter à sua disposição novas aeronaves, como o Airbus A330 MRTT e o Boeing C-17 Globemaster III.
Como resultado da experiência de emprego em combate no Iraque e no Afeganistão, o emprego de helicópteros passou por profunda reformulação nas forças britânicas, acabando por levar à formação de dois comandos conjuntos, envolvendo as três forças armadas britânicas.
Em 2007, o governo britânico anunciou a decisão de se proceder à construção de dois porta-aviões da classe Queen Elizabeth. Além de helicópteros, esses porta-aviões operam o Northrop-Grumman F-35B Lightning II, o mais novo e avançado caça a jato em serviço na RAF. Apesar de o governo britânico ter anunciado a intenção de se adquirir 138 exemplares, em diferentes lotes, até o momento não há indicação de que todos sejam adquiridos. O primeiro lote de 48 exemplares foi adquirido em 2012; o primeiro esquadrão operacional a receber o F-35B Lightning (como é conhecido na RAF, sem o “II”) foi o famoso Esquadrão Nº 617 “Dambusters”, cujos pilotos levaram os primeiros quatro exemplares em voo desde os EUA chegando no Reino Unido no dia 6 de junho de 2018. Aliás, outro aspecto interessante na operação dos F-35B é que tanto pilotos, como especialistas e mecânicos, pertencem tanto à RAF como à Marinha Real, algo que já havia ocorrido durante o emprego dos Harriers, e que evidencia o caráter conjunto de emprego, a bordo de porta-aviões.
O principal objetivo da Royal Air Force é fornecer os efeitos militares necessários em toda a gama completa do Poder Aéreo e Espacial, protegendo a integridade do espaço aéreo do Reino Unido diariamente e conduzindo outras operações de gerenciamento de conflitos e crises no país e no exterior. As principais funções da RAF são:
Controle do Ar – garantindo a liberdade de ação no domínio aéreo e permitindo liberdade de manobra nos domínios marítimo e terrestre.
Ataque – entregando efeitos de poder aéreo, cinéticos e não cinéticos, em todos os domínios (Aéreo, Terrestre, Marítimo, Cibernético e Espacial).
Inteligência, Vigilância e Reconhecimento – Desenvolvimento da consciência situacional e aumento da compreensão da situação estratégica e tática.
Mobilidade Aérea – Permitindo operações, implantando, sustentando, recuperando forças e produzindo um efeito decisivo por meio de atividades como a ajuda humanitária.
Comando e Controle Aéreo – Permitindo o fornecimento do poder aéreo.
Espaço – Desenvolvendo a consciência situacional e responsável pelo espaço em operações afetas à defesa para operar e gerar elementos de capacidade espacial.
Organização da Royal Air Force
A RAF é formada por militares da ativa e da reserva. Essa, por sua vez, é formada por militares que deixaram o serviço ativo, passando a integrar a Royal Auxiliary Air Force (RAuxAF), e por pessoal civil, que são voluntários e recebem treinamento militar. Segundo dados do governo britânico, em 1º de janeiro de 2022, a RAF contava com um efetivo de 36.963 militares, sendo 32.878 da ativa, 980 reservistas e 2.926 da reserva voluntária.
A Real Força Aérea é organizada com um Estado-Maior e um Air Command (Comando Aéreo) ao qual são subordinados cinco grupos. Os grupos, por sua vez, são formados por esquadrões, esquadrilhas, alas e outras formações operacionais, além de centros, diretorias e escolas. A sede da Royal Air Force e do Air Command fica na estação da RAF em High Wycombe, a noroeste de Londres.
O Chefe do Estado-Maior (um oficial-general de quatro estrelas) é o comandante da RAF que se reporta ao Chefe do Estado-Maior de Defesa (ocupado em rodízio entre as três forças armadas). O ChEM RAF é assessorado pelos dois vice-chefes do Air Command (oficiais-generais de três estrelas), de Operações e de Capacidades (o Air Command não tem um chefe), bem como por dois assistentes, de Estratégia e de Planejamento e pelo Diretor de Recursos.
O vice-chefe de Operações é o segundo-em-comando da RAF, e é o responsável pela condução de operações aéreas e espaciais no Reino Unido e no exterior. São subordinados a ele os comandantes (oficiais-generais de duas estrelas) dos grupos 1, 2, 11 e 22.
O vice-chefe de Capacidades é o responsável pelo planejamento estratégico e provisão de pessoal, equipamentos, infraestrutura e treinamento. A ele são subordinados o Chefe de Pessoal, o Chefe de Capacidades, o Capelão-em-Chefe, o Diretor Jurídico e o Chefe do Serviço Médico.
Siga-nos no Twitter @RFA_digital
@CAS