A Base Aérea da RAF Fairford, Reino Unido, amanheceu movimentada na última sexta-feira – 04 de setembro de 2020, com a decolagem de três bombardeiros B-52H da USAF, pouco antes das 07:00 da manhã. Os Buff’s pertencem ao 5th Bomb Wing, da Minot AFB, Carolina do Norte, e que desde 24 de agosto estão compondo a BTF 20-4 (Bomber Task Force) no Reino Unido.
Utilizando indicativos de chamada no rádio, “JULIA 51″ (AF 61-0034), “JULIA 52” (AF 60-0005) e “JULIA 53” (AF 60-0044), os bombardeiros tinham como objetivo realizar um exercício aéreo da OTAN, em conjunto com a Força Aérea Ucraniana, na região do Mar Negro, próximo a Criméia.
Diferente da quase totalidade das missões que envolvem os bombardeiros estratégicos americanos, esta missão ocorreu completamente “as claras”. Duas aeronaves (60-0005 e 60-0044) mantiveram – propositalmente – os seus equipamentos transponders Mode-S ligados todo o tempo. Desta forma, foi possível rastreá-los durante o trajeto, incluindo as manobras e órbitas que realizadas próximo ao Mar Negro.
Originally tweeted by ”The Lazy ? Garden ?” Eindhoven Spotter (@EHEH_Spotter) on 4 de September de 2020.
Apesar de relatos que a operação americana em espaço aéreo ucraniano seria inédita, o The Aviationlist apresentou dados esclarecendo os fatos. Segundo o site, em 26 de setembro de 1994, três aeronaves da USAF, sendo um B-52, um B-1 e um KC-10, pousaram na Base Aérea de Poltava, Ucrânia. Esta seria a primeira vez que bombardeiros americanos pousaram naquele país, desde a Segunda Guerra Mundial.
Os três B-52H decolaram próximo às 06:30LT de RAF Fairford, tomando proa leste, em direção a Holanda, seguindo pelo norte da Alemanha, o sul de Varsóvia, na Polônia, e aproximadamente as 08:45LT entraram na FIR Kyiv, espaço aéreo ucraniano. A partir deste momento, os B-52 foram acompanhados durante todo o voo por caças da Força Aérea da Ucrânia (UAF), sendo dois Mig-29C, o 43bl do Esquadrão 114BrTA e o 72wh do 204brTA, além de dois Su-27S, o 33bl do 831BrTA e outro não identificado. Por mais de uma hora, a esquadrilha realizou evoluções às marges do Mar de Azov, muito próximos ao espaço aéreo russo.
O E-3A Sentry da OTAN, código rádio “NATO02” (LX-N90456), decolou da Base Aérea da OTAN Geilenkirchen, na Alemanha, e acompanhou a esquadrilha americana até próximo a Varsóvia. O AWACS permaneceu em vigilância sobre território polonês, durante todo o tempo da missão dos bombardeiros na Ucrânia, para antecipar qualquer “surpresa do leste”.
Sem a preocupação de esconder nada, os exercícios da OTAN aconteceram muito perto da área conturbada da Crimeia, chamando a atenção da defesa aérea da Rússia! Notoriamente para muitos o exercício foi um misto de teste de defesas e sutil provocação.
A agência de notícias TASS, comunicou que o Centro de Controle de Defesa Nacional da Rússia acionou oito caças, sendo quatro Su-27 e quatro Su-30, para interceptar os três aviões americanos, que voavam muito próximos a fronteira russa, sobre a região do Mar Negro e do Mar de Azov. Como de costume, a nota foi encerrada informando que a incursão no espaço aéreo do país não foi permitida, e que a ação foi bem sucedida e realizada de forma segura.
Por sua vez, a OTAN e o EUCOM emitiram uma nota informando sobre o treinamento conjunto entre os bombadeiros da USAF e aeronaves da Força Aérea da Ucrânia, foi realizado somente em espaço aéreo ucraniano.
A missão “JULIA” na Ucrânia sem dúvidas foi mais um sinal claro enviado à Rússia, sobre o interesse estratégico da OTAN e dos Estados Unidos pelo Mar Negro. Recentemente foram enviadas aeronaves B-1B e F-16 para treinamento em perfis de ataque empregando mísseis LRASM (Long Range Anti-Ship Missile) e táticas com mísseis de cruzeiro do tipo JASSM (Joint Air-to-Surface Standoff Missile).
O Mar de Azov separa a Ucrânia e a Rússia, é o ponto nevrálgico das tensões entre Moscou e Kiev/OTAN, principalmente depois de 26 de fevereiro de 2014, quando O Governo Putin anexou a Península da Crimeia à Federação Russa. O Mar de Azov é estrategicamente importante para a Rússia, porque mantém um importante porto militar na região, e pelo Estreito de Kerch que fornece saída para o Mar Negro. A Ucrânia reclama da intervenção russa no estreito, que além de controlar todo o tráfego marítimo que por ali passa, recentemente construiu uma ponte de quase 20 km sobre o Kerch, ligando o continente russo à Criméia.
O Exercício dos B-52H foi monitorada de perto por aeronaves ISR (Intelligence Surveillance Reconnaissance), da RAF, da USAF e da U.S.Navy. Sobre o Mar Negro estavam em missão de vigilância o RC-135W Airseeker (ZZ666 – “RRR7258”) e o Sentinel R1 (ZJ692 – “RRR9986”) da RAF, o RC-135W Rivet Joint (AF 62-4125 – “SALMA 44”) da USAF, um P-8 Poseidon da USN, além do E-3 Sentry mencionado anteriormente. Todos permaneceram de olho, provavelmente monitorando as reações das defesas aéreas russas à presença dos B-52.
O KC-135R (AF 61-0315 – “QID89”), decolou da RAF Mildenhall e foi posicionado sobre a Polônia, possivelmente para reabastecer os bombardeiros no voo de volta. O tempo total de voo foi de aproximadamente 08h30.
O desenrolar da operação dos B-52H americanos foi completamente “ao vivo”, e o desfecho não poderia ser diferente. A OTAN e o Departamento de Defesa dos USA (através da EUCOM), lançaram nota oficial divulgando o sucesso da missão. O Ministério de Defesa da Ucrânia e a USAF divulgaram vídeos e fotos espetaculares das suas aeronaves voando lado-alado. Finalmente, a Rússia, por sua vez, lançou a nota informando que os seus caças impediram a intromissão estrangeira no seu espaço aéreo.
@FFO