Canadá escolheu o F-35 e agora? Depois de uma década na busca do substituto para os Boeing CF-188 (CF-18 Hornet) da Royal Canadian Air Force (RCAF), no dia 28 de março o Governo do Canadá anunciou que a procura havia sido encerrada e que a americana Lockheed Martin e seu F-35A haviam sido escolhidos. Porém, o anúncio trouxe mais dúvidas que respostas e isto, poderá atrapalhar o negócio, especialmente quando visto pelos olhos da oposição do governo.
A Ministra de Compras do Canadá Filomena Tassi e a Ministra da Defesa Anita Anand confirmaram em uma coletiva de imprensa que o caça furtivo da Lockheed Martin venceu o sueco Saab Gripen uma competição internacional no dia 28 de março, no que para muitos o F-35 já havia perdido.
Vale lembrar que o Canadá é investidor do JSF desde 1997 como parceiro industrial nível 3, mas em meio ao desenvolvimento, críticas, aumento de custos, trocas de governo criaram uma situação surreal, onde apesar de ter investido no projeto, optou por não comprar a aeronave, e sim, fazer uma licitação internacional que se arrastaria por uma década. Todos os demais investidores do JSF dos níveis 1, 2 e 3 optaram pela compra do F-35.
O governo conservador de Stephen Harper prometeu comprar 65 caças F-35 sem concorrência em 2010, pouco antes que as preocupações com o custo e as capacidades do caça furtivo o forçassem a voltar refutar o projeto. O que se seguiu foi um imbróglio em meio as trocas de governo. Em 2015 o governo liberal disse que não ai comprar o F-35, mas lançar uma competição aberta para substituir o CF-18. Mais tarde, eles articularam a compra de 18 Super Hornets sem licitação, fato que foi “impedido” pelo parlamento até que uma licitação completa fosse lançada. A questão política foi sempre o impasse e discussões sugerindo que os liberais estavam tentando encontrar uma maneira de prender o Canadá no Super Hornet sem dar oportunidade a outros fabricantes virou centro da discussão. O plano de comprar os F/A-18E/F sem licitação foi por água abaixo após a Boeing entrar em litígio com a Bombardier na Organização Mundial do Comércio em 2017, por disputas e subsídios na aérea de aviação comercial.
Com isto o governo do Canadá lançou uma licitação internacional em julho de 2019, que culminou com a vitória do F-35, ou seja, o mesmo caça que o Canadá havia investido desde 1997. Ainda sim a RCAF terá que investir cerca de US$ 500 milhões para manter a frota de CF-188 até 2032, data que deve ser desativados de vez, com 50 anos de serviço. Críticos disseram que isto poder ter sido evitado se o plano original de comprar o F-35 tivesse sido mantido. O Canadá contribuiu com US$ 613 milhões para o desenvolvimento do F-35 desde 1997 e como os demais apoiadores do JSF, já poderia estar operando a aeronave.
O governo do Canadá iniciará negociações formais com a Lockheed Martin neste mês de abril para a compra de 88 F-35A em um processo que deve durar de sete meses a um ano para produzir o contrato final. Tassi e Anand insistiram que as negociações não significam que o acordo com o F-35 esteja concluído e que o governo mantém a opção de conversar com a Saab, se e somente se, as negociações com a Lockheed Martin pararem. “Temos que falar sobre requisitos de capacidade, custos, prazos e quando teremos esses aviões. Portanto, ainda existem alguns parâmetros e variáveis a serem discutidos.”
Quanto ao custo projetado de US$ 19 bilhões, Anand disse que será “mais ajustado”. As autoridades expressaram otimismo de que um acordo será fechado nos próximos sete meses, com o primeiro F-35 chegando em 2025 e o último por volta de 2032. A CEO da Lockheed Martin Canada, Lorraine Ben, saudou o início das negociações em um comunicado, enquanto a porta-voz da Saab Canada, Sierra Fullerton, disse que a empresa respeitou a decisão do governo e deixou a porta aberta para novas negociações.
“Estamos baseando esta decisão em fatos e evidências com base em todas as avaliações que foram feitas. E posso dizer que é rigoroso. O segundo ponto é que a própria concorrência leva os licitantes a apresentarem sua melhor oferta”. O governo canadense descreveu a decisão como “livre de interferência política”, dizendo que as propostas apresentadas pelas duas empresas foram avaliadas por servidores públicos apartidários de três departamentos que recomendaram por unanimidade o F-35.
As discussões são amplas e muitos observadores consideraram que o Boeing Super Hornet e o F-35 eram de fato a única opção e a verdadeira competição pelo contrato, por causa da estreita relação do Canadá com os Estados Unidos, que inclui o uso conjunto de caças para defender o espaço aéreo norte-americano diariamente (NORAD). Essa percepção foi ampliada depois que duas outras empresas europeias deixaram a concorrência antes de seu início, reclamando que as exigências do governo haviam favorecido as rivais americanas.
Em particular, tanto a Airbus quanto a Dassault reclamaram do que definiram como “requisitos onerosos” à adaptação de suas aeronaves Typhoon e Rafale, respectivamente, para atender aos requisitos de compartilhamento de inteligência do Canadá com os EUA. A Airbus, que desistiu da corrida em agosto de 2019, também expressou frustração com a decisão do governo de mudar uma política de longa data que exige que os licitantes de contratos militares se comprometam legalmente a investir no Canadá.
A Suécia não é membro da OTAN ou NORAD, oque levantou questões sobre a compatibilidade do Gripen e seus sistemas com as aeronaves americanas. Para ampliar o debate que foi descrito pela mídia canadense como uma “discreta ação pra favorece a Lockheed Martin” a Boeing foi eliminada da competição em dezembro de 2021, preparando o terreno para uma disputa final entre o F-35 e o Gripen. Para alguns parlamentares canadenses, houve um arrependimento de não mater o país na fila do F-35 como parceiro do JSF. E foi feito um arranjo para que isto fosse corrigido, sem que ficasse “muito feio” para o governo, que a decisão, tomada no passado, havia sido equivocada.
Depois de todo o imbróglio, hoje as dúvidas pairam é sobre o contrato e quando e a que preço será assinado; a configuração das aeronaves e quando os 88 F-35A começam a desembarcar no Canadá. Isto será alvo do contrato que será firmado nos próximos meses. Se for confirmado e assinado — tudo indica que sim, o F-35 ganha seu 19 operador ou futuro operador em 15 países.
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