Força Aérea Afegã estava voando no limite. Um relatório do Special Inspector General for Afghanistan Reconstruction (SIGAR) – uma agência independente criada pelo Congreso Americano para fiscalizar a reconstrução do Afeganistão, informou que a saída das tropas americanas sobrecarregou ainda mais Força Aérea do Afeganistão (AAF), reduzindo a operacionalidade e a eficiência, o que contrapôs as declarações do Governo Americano que os Afegãos estavam prontos para assumir a missão.
A decisão dos EUA de sair definitivamente do Afeganistão, que culminou na queda do Governo e na retomada do poder pelo Talibã, com consequências futuras ainda nebulosas, escancarou a fragilidade da AAF, a um ponto inimaginável, se lembrarmos do discurso dos EUA, endossado pelo presidente Joe Biden, de que os afegão estavam bem equipados, bem treinados e prontos para assumir não só a segurança do país, mas sufocar as as ações do Talibã.
O relatório aponta que não só não estavam prontos, como dependentes das ações de americanos e aliados. O anúncio da saída fomentou uma desmobilização que vinha ocorrendo desde 2019, com as tropas americanas sendo reduzidas e cada vez menos se envolvendo em ações cruciais, estas passadas muitas vezes 100% aos afegãos.
A partir de abril, com o início da retirada final, a AFF passou voar grande parte das ações ofensivas e de apoio as tropas em solo, o que causou uma sobrecarga, não só por não contar com apoio americano, mas porque esta brecha foi explorada pelo Talibã, que intensificou assim, as suas ações visando quebrar o moral das Forças Armadas Afegãs. A sobrecarga só piorou a partir de junho, à medida que as condições de segurança no Afeganistão se deterioravam e exigência de mais ações militares só cresciam.
A frota de helicópteros UH-60 Black Hawk da AAF, por exemplo, teve uma taxa de prontidão de apenas de 39% em junho, cerca de metade do nível de abril e maio. Todas as aeronaves da AAF estavam voando pelo menos 25% acima dos intervalos de manutenção programada recomendados pelos fabricantes, informou o SIGAR.
“Todas as plataformas de aeronaves estavam sobrecarregadas devido ao aumento dos pedidos de apoio aéreo aproximado, inteligência, vigilância, missões de reconhecimento e reabastecimento aéreo, agora que os militares afegãos carecem de apoio aéreo dos EUA”, escreveu o SIGAR em seu relatório.
Questões de disponibilidade afetaram os C-208, C-130, MD530F e Mil Mi-17. Os A-29B tiveram uma taxa pouco abaixo de 50%, com várias missões abortadas, não so por problemas de manutenção, mas por falta de tripulações.
Outro ponto importante em relação às tripulações da AAF foi um relatório (da Reuters) de que o Talibã estava deliberadamente visando o assassinato de pilotos afegãos, confirmado pelo documento. O objetivo era inviabilizar as missões e criar o “medo” institucional na AAF. Ao longo dos anos vários pilotos foram assassinados ou ameaçados, a ponto de muitos desertarem e pedirem asilo. Mas nunca esta prática foi tão intensa e considerada uma “tática” como nos últimos três meses. Nas últimas semanas sete pilotos de A-29 foram assassinados seletivamente, com apoio e incentivo dos líderes do Talibã.
Junto com as Forças Especiais do Afeganistão, a Força Aérea Afegã era um pilar da estratégia do país para evitar a tomada de cidades pelo Taleban. Mas as Forças de Operações Especiais também estavam sendo mal utilizadas, informou o SIGAR. Citando dados da OTAN, o SIGAR disse que quando os comandos afegãos chegavam, eles eram mal utilizados, sendo desviados para executar tarefas destinadas às forças convencionais, incluindo liberação de rotas e segurança de pontos de controle.
A maior parte do corpo do Exército Nacional Afegão por sua vez, se recusava a executar missões sem o apoio de seus comandos de elite. Missões que não eram executadas, permitiram o avanço do exército do Talibã, que não possui situações similares, agindo sempre de forma objetiva e muitas vezes com espírito de “matar ou morrer”.
Ainda assim, o relatório advertiu que é difícil avaliar o que constitui mau uso militar das forças de elite quando o governo afegão “estava lutando por sua existência”.
Aproximadamente US$ 144,98 bilhões foram alocados para a segurança e a reconstrução do Afeganistão desde 2002. Esses fundos são usados para construir as Forças de Segurança Nacional do Afeganistão, promover a boa governança, conduzir assistência ao desenvolvimento e participar de esforços antinarcóticos e anticorrupção.
@CAS