
Venezuela recorre à Rússia em busca de mísseis balísticos. O deputado russo Alexei Zhuravlyov afirmou que Moscou já fornece armas à Venezuela e não vê nenhum obstáculo para a transferência do novo míssil balístico Oreshnik ou dos mísseis de cruzeiro Kalibr para Caracas.
Essas declarações surgiram em meio a pedidos públicos de assistência militar a Rússia, China e Irã por parte de autoridades venezuelanas, em resposta ao que descreveram como crescente pressão dos EUA e rumores de uma possível operação americana.
Ao longo do último ano, tanto a mídia ucraniana quanto a ocidental descreveram o Oreshnik como um míssil balístico terrestre de alcance intermediário, derivado da linha RS-26, com velocidades máximas próximas a Mach 10 e um alcance teórico de aproximadamente 5.000 quilômetros. Washington o classificou inicialmente como um sistema de alcance intermediário após o ataque a Dnipro em novembro de 2014, e posteriormente acrescentou que ele pode transportar múltiplas ogivas.
Em sua entrevista, Zhuravlyov foi além, chamando o sistema de um “novo desenvolvimento” que a Rússia poderia enviar a um país “amigo” como a Venezuela.
Já à família Kalibr apresenta um problema diferente. As variantes russas de ataque ao solo têm um alcance estimado entre 1.500 e 2.500 quilômetros, enquanto as versões de exportação “E” normalmente têm um alcance de cerca de 300 quilômetros, conforme as diretrizes do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis (MTCR).
Os lançadores Club-K, alojados em contêineres que comportam quatro mísseis de cruzeiro Kalibr em um contêiner de transporte padrão de 20 ou 40 pés, constituem uma unidade de lançamento discreta e de fácil transporte, que pode ser colocada em caminhões, vagões ferroviários ou navios mercantes e militares.

O motivo pelo qual Caracas deseja esses sistemas é simples: a Venezuela busca há tempos contrabalançar a superioridade militar convencional dos Estados Unidos e suas demonstrações esporádicas de força no Caribe. Nas últimas semanas, Washington aumentou sua presença naval e aérea, incluindo um grupo de ataque comporto por um porta-aviões nuclear (USS Gerald R. Ford) e demonstrações de força com voos de bombardeiros B-1B e B-52H perto do espaço aéreo venezuelano, como parte de uma campanha antidrogas.
Os mísseis Oreshnik forneceriam a Caracas um instrumento coercitivo ao nível de teatro de operações. Sua mobilidade terrestre permite o lançamento em plataformas móveis. Se implantados no norte da Venezuela, mesmo uma bateria simbólica obrigaria os Comandos Norte e Sul dos EUA a alocar mais navios de defesa antimíssil balístico Aegis e capacidades persistentes de inteligência, vigilância e reconhecimento (ISR) para rastrear os lançadores móveis e preparar interceptores.

O Kalibr completaria a outra metade do quadro de dissuasão. Uma rede de lançadores costeiros ou em contêineres poderia ameaçar bases operacionais avançadas e unidades navais num raio de 300 quilômetros.
Como é do perfil do Nicolas Maduro, a Venezuela provavelmente faria demonstrações públicas de unidades de mísseis e divulgaria imagens seletivamente, além de realizar um teste controlado do míssil Kalibr numa área segura no mar.
Caso a crise se agrave, o próximo passo poderia ser um ataque preventivo contra um depósito de combustível avançado ou um complexo portuário que dê suporte às operações dos EUA em Porto Rico, que forçariam o reposicionamento dos sistemas de defesa antimíssil dos EUA. A medida mais arriscada seria qualquer disparo balístico em direção ao território dos EUA, um ato que provocaria uma forte retaliação e, portanto, é mais valioso para Caracas como ameaça do que como ação em si.
Do ponto de vista legal e diplomático, qualquer transferência entraria em conflito com as regulamentações do Missile Technology Control Regime (MTCR). O regime impõe que seus parceiros a neguem as exportações de sistemas de Categoria I capazes de transportar uma carga útil de pelo menos 500 quilogramas a um alcance mínimo de 300 quilômetros, o que afetaria diretamente o Oreshnik e imporia severas restrições aos modelos Kalibr de longo alcance.
A Rússia é parceira, mas o MTCR é um acordo informal, não um tratado, e Moscou normalmente trata suas vendas como decisões soberanas em resposta às ações dos EUA. Espera-se que a Rússia argumente que as variantes do Kalibr com restrições de exportação estão conforme o MTCR, enquanto culpa Washington pela escalada.

Os laços de defesa entre a Rússia e a Venezuela conferem credibilidade a essa ameaça. Caracas adquiriu 24 caças multifuncionais Su-30MK2 a partir de 2006 e, posteriormente, implantou um sistema de defesa aérea de longo alcance baseado no sistema S-300VM Antey-2500, complementado pelos sistemas de defesa antiaérea de médio alcance Buk-M2E e de defesa de ponto Pantsir-S1.
Relatórios públicos e fontes da indústria indicam que as entregas do Buk-M2E ocorreram entre 2013 e 2015, enquanto o S-300VM apareceu publicamente pela primeira vez na Venezuela em 2013, após entregas que, segundo fontes independentes, datam de cerca de 2012. O estoque tem sido mantido esporadicamente desde então; no entanto, voos recentes de aeronaves russas Il-76 para Caracas sugerem reativar programas de logística e treinamento.
Para Washington, os riscos são muito reais. A presença de mísseis Oreshnik na Venezuela exigiria cobertura permanente do sistema Aegis no Caribe e buscas ininterruptas por mísseis teleguiados, enquanto mesmo uma presença limitada de mísseis Kalibr tornaria extremamente difícil a defesa dos cais, locais estratégicos e depósitos de munição em Porto Rico.
A capacidade da Venezuela de operar sistemas complexos de mísseis sob sanções e pressão econômica não é garantida, e as alegações russas sobre o desempenho do Oreshnik foram apenas parcialmente verificadas por fontes abertas. Mas a lógica política é clara: ao exibir o Oreshnik e o Kalibr, Moscou tranquiliza um parceiro, vangloria-se de suas capacidades e força os estrategistas americanos a investir tempo, navios e recursos de inteligência, vigilância e reconhecimento em uma nova frente.
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